Reforma tributária: vai gerar a saída de empresas de tecnologia do Brasil?

Reforma tributária: vai gerar a saída de empresas de tecnologia do Brasil?

Diego Brites Ramos

Não há dúvidas que a Reforma Tributária é uma demanda importante. Ela visa a simplificação das cobranças, proporcionar mais transparência e estimular a economia. No entanto, por mais necessária que ela seja, é preciso se conscientizar que, do jeito que ela se encaminha para ser aprovada, tende a elevar demasiadamente os custos de alguns serviços, como os de tecnologia da informação, inovação, serviços digitais e internet. Por isso lutamos tanto por uma emenda que instituísse um regime diferenciado para um setor que, mundialmente, representa forte potencial de crescimento de PIB, renda e empregos de qualidade.

Em uma sociedade cada vez mais digitalizada, a tecnologia se tornou um vetor transversal e fundamental para o funcionamento da maioria dos negócios e serviços prestados à população como Saúde, Serviços Financeiros, Educação, Comércio, Entretenimento, entre tantos outros. Ela é ainda base para o desenvolvimento de todos os demais setores como Indústria e Agronegócios, impactando desde o pequeno empreendedor, do profissional liberal até a grande empresa. O aumento da alíquota para o setor tecnológico oferece ainda riscos que podem inviabilizar a presença das empresas de tecnologia no Brasil, resultando na saída para outros países onde a carga tributária é menor, e levando com ela a nossa força de trabalho qualificada e todo o progresso e riqueza que elas geram para uma nação.

Foi o que aconteceu com os Estados Unidos, por exemplo. Segundo um estudo do Instituto Hoover, da Universidade de Stanford, 352 das maiores empresas da Califórnia deixaram o estado entre 2018 e 2021. Parte delas migrou para outros estados, como o Texas. Por quê? Porque enquanto, na Califórnia, o Imposto sobre o Lucro é 8,85%, no Texas é 0%. Além deste, outros tributos, quando comparados entre um estado e outro, também são menores.

Incentivos fiscais e tributários vantajosos são suficientes para empresas não apenas migrarem para outros estados, mas para outros países como a Irlanda, por exemplo. De uns anos para cá, o país europeu se tornou um dos destinos preferidos das empresas de tecnologia. Os motivos? Carga tributária fixada em 12,5% sobre o valor de venda do produto ou serviço, isenções, créditos, entre outros benefícios que geram um ambiente mais favorável aos negócios, incentivam a chegada de novas empresas com viés tecnológico (startups) e, consequentemente, estimulam a inovação. Os impactos positivos foram muitos: cerca de 31 bilhões de euros são injetados na economia irlandesa anualmente, crescimento de 12,2% no PIB em 2022 (enquanto os países da Zona do Euro cresceram em média 3,5% no mesmo período), aumento de 50% com impostos corporativos e muito mais.

Não é preciso ir tão longe para ver que a redução de impostos no setor de tecnologia resulta em mais arrecadação. A cidade de Florianópolis, em Santa Catarina, é conhecida por ser um polo tecnológico importante para o Brasil e possui um ISS reduzido de 2% desde 2000. Em um pouco mais de 20 anos, a cidade já colhe os frutos dessa iniciativa: de 2010 a 2020, o número de empresas de tecnologia saltou de 489 para 3.900, o faturamento do setor foi de R$ 958 mil a R$ 6,4 bilhões, o PIB per capta aumentou de R$ 26,7 mil para R$ 43,7 mil e, atualmente, o segmento é o que mais arrecada impostos no município (cerca de 35% do ISS vem do segmento). Ou seja, a redução do imposto não apenas resultou numa arrecadação maior como contribuiu diretamente na qualidade de vida de quem mora na região.

O texto aprovado em dois turnos no plenário do Senado Federal não permite o creditamento do maior insumo da nossa atividade – a mão de obra –, com uma alíquota que pode chegar a 27,5%, ensejará na inevitável elevação nos preços em produtos e serviços que necessitam da tecnologia para operar. Como falei inicialmente, em uma sociedade em que a tecnologia se faz tão presente e é responsável pelo aumento da produtividade, melhor tomada de decisão, mais eficiência operacional e até de fomento à agenda ESG, esse crescimento de taxas representa um atraso para o Brasil, tendo em vista que a tecnologia é um fator fundamental e indispensável para o desenvolvimento econômico e social de qualquer País.

A Reforma Tributária, que agora volta para a Câmara Federal, está muito próxima de ser aprovada, mas necessita de mudanças urgentes para que consiga, de fato, gerar as vantagens as quais ela se propõe, caso contrário, será um obstáculo para a manutenção e a sobrevivência de algumas empresas no País. A tecnologia é portadora de futuro e está presente no dia a dia de todos, nos ajudando nas mais variadas tarefas, e não podemos retroceder. Nenhuma das emendas apresentadas a fim de garantir ao setor de Tecnologia um desconto nos futuros impostos IBS e CBS que serão criados, semelhante ao que deve acontecer com os segmentos de Serviços de Saúde, Educação, Transporte Coletivo, entre outros, foi acatada pelo relator. 

Agora, cabe a todos nós nos preparar para os reais impactos que a Reforma Tributária trará às nossas vidas se ela for ratificada em plenário. Até que isso aconteça, vamos continuar debatendo e lutando pelas mudanças necessárias para que ela atinja, de fato, os seus objetivos. 

*Diego Brites Ramos é Vice-Presidente de Relacionamento da Associação Catarinense de Tecnologia (ACATE)