Em busca da melhor liderança para se trabalhar

Julio Cezar Bernardelli (*)

“Great Place to Work”, em tradução livre significa “um ótimo lugar para se trabalhar”. Como identificar esse melhor lugar? A pesquisa Great Place to Work, realizada anualmente, composta por entrevistas e levantamentos de dados pode ser uma opção? Com licença, vou parafrasear William Shakespeare: há mais coisas entre uma pesquisa e a realidade do dia a dia, no local de trabalho, do que sonha a nossa vã percepção.

A falta de empatia, por parte de pessoas em cargo de chefia, seja em instituições públicas ou privadas, é percebida pela equipe de trabalho, mas, se essa percepção é coletiva, por que as ações de repudio não o são? Falta o senso de coletividade? Ou será que o temor do desemprego fala mais alto nesses momentos?

Talvez esse argumento se justifique nas empresas privadas, mas quem é concursado deveria ter a possibilidade de se manifestar com mais liberdade e menos receio. Mas não é bem assim.

Pessoas adoecem, sem motivo aparente, no seu local de trabalho. A alegria de alguns desaparece. O silêncio toma conta do ambiente e dos corações. A criatividade cede lugar para o trabalho rotineiro. As pessoas deixam de ser colaborativas e a contagem regressiva para encerrar o expediente começa.

O isolamento social, imposto para conter uma pandemia, também isolou os sentimentos. Parece que não nos importamos mais com as pessoas. Precisamos de resultados. Precisamos mostrar que conseguimos atingir as metas.

Se seu chefe superou essa fase difícil de ficar em casa, por que você não superaria? Depressão? Frescura. Levanta a cabeça e vai trabalhar que passa. Você já teve bastante tempo em casa para superar seus traumas. São exemplos de frases e colocações que não contribuem para a melhoria do clima organizacional.

Trauma. Talvez seja essa a palavra para definir o sentimento que nasce entre os membros de uma equipe chefiada por uma pessoa sem empatia com seus colaboradores. Trauma, medo pelo que possa ocorrer, caso se revolte com o status quo. Será que instituições públicas, já burocratizadas pelas normas rígidas, conseguem criar um Great Place to Work?

Chefes que transformam suas equipes em pacientes a espera de uma consulta com psicólogos e psiquiatras (claro que fora do horário de expediente), parecem fazer parte do “novo normal’. Superiores hierárquicos que ignoram os sinais e os apelos de seus subordinados por um socorro, enquanto há tempo, para se recuperar o ambiente de trabalho e o clima organizacional, também fazem parte dessa era de quase pós-pandemia.

As empresas, em qualquer classificação, buscam ser reconhecidas como um “ótimo lugar para trabalhar”. Podem até ser. Podem realmente ser um “ótimo lugar para trabalhar”, mas por que o sendo, as pessoas ainda pedem para sair? Por que grandes talentos abandonam esse “ótimo lugar para trabalhar”? Por que funcionários concursados desistem de seus cargos?

Oito em cada dez profissionais pedem demissão por causa do chefe. É o que aponta levantamento da consultoria de recrutamento Michael Page com candidatos a vagas de emprego. Apesar desse levantamento ser de 2019, ainda é valido.

Por outro lado, apesar de grandes dificuldades encontradas em algumas empresas, que não se enquadram como um “ótimo lugar para trabalhar”, segundo as enquetes, pessoas talentosas permanecem trabalhando e se sentindo parte dessa esfera profissional, pois criam empatia com as lideranças e seus projetos.

Muito se falou que sairíamos melhor pós-pandemia. Mas o risco de empresas voltarem ao trabalho presencial e manterem os padrões de antes e, até mesmo, tornarem mais rígidos seus controles, pode levar alguns funcionários, que desenvolveram suas atividades em home office, com maestria, a buscarem novas oportunidades em empresas que também podem ser um “ótimo lugar para trabalhar”.

Está na hora de perceber que as pessoas, realmente, buscam um “ótimo lugar para trabalhar” e que apenas a segurança de um concurso público, ou um ótimo salário em empresa privada, não garantem a retenção desses talentos, pois as pessoas estão valorizando muito mais uma “ótima liderança para colaborar”, para juntas criarem um “ótimo lugar para trabalhar”.

*Julio Cezar Bernardelli é professor da Escola Superior de Gestão, Comunicação e Negócios da Uninter.