Em tempos de Covid 19, distanciamento, isolamento, quarentena e leis e mais decretos e liminares no judiciário, temos a Lei Geral de Proteção de Dados aguardando sua vigência a partir de Agosto de 2020 (se nada mudar até lá, afinal, nem Autoridade Nacional de Proteção de Dados temos de forma concreta ainda).
E com este cenário de pandemia, temos visto alguns movimentos que usam a tecnologia teoricamente para o bem, mas com um viés de que a coletividade vale mais que a individualidade, e nesta realidade temos que pensar o quanto estamos sendo invadidos para que a coletividade tenha dados e informações para fins supostamente benéficos a todos.
Parece até piada de primeiro de Abril, mas neste dia o ministro da saúde brasileiro, sr. Luiz Henrique Mandetta, defendeu publicamente que as empresas de telecomunicação deveriam flexibilizar a proteção dos dados de seus usuários para auxiliar na contenção da pandemia no país.
Nas palavras dele:
“Eu chamo para uma pessoa, é um serviço automatizado, identifico que aquela pessoa tem necessidade. E para eu avisar a Secretaria de Saúde, avisar o departamento de saúde “essa pessoa mora na rua tal, endereço tal”, a gente busca pelo número de telefone a base de cadastro onde tem essa informação e remete para a Secretaria de Saúde “.
FONTE: HTTPS://BR.NOTICIAS.YAHOO.COM/POR-CORONAV%C3%ADRUS-MANDETTA-QUER-ACESSO-211413735.HTML
E afirmou ainda que caso as empresas não queiram, ele pensa em estatizar esta informação para que possa ter acesso rápido.
Quer dizer, um acesso a informações particulares para “facilitar” acesso a pessoa (que sequer se considera se o endereço está correto, se o telefone que estou ligando é realmente meu, telefones corporativos que não têm endereço do particular, etc) e localizar ela no ato.
Estamos realmente dispostos a abrir a porteira de todos nossos dados?
Estamos querendo dar para o estado toda informação de qualquer ente privado?
Começamos por uma epidemia. Depois podemos expandir para casos de crimes. Depois podemos ir para devedores do fisco e por aí vai.
Poder ilimitado ao Estado e cadê as garantias individuais do cidadão?
Basta ler a Lei Geral de Proteção de Dados para perceber que tal medida vai na contramão do poder que o titular tem em relação a seus dados.
Entendo que a pandemia é um estado de exceção, contudo, deixar todo poder concentrado em nome disto é um filme batido e bem conhecido dos diversos regimes de poder autoritários da América Latina.
Mesmo com a declaração do sindicato das empresas de TELECOM que tal medida será feita dentro do Marco Civil da Internet e da LGPD, fornecendo dados anonimizados e não individualizados como anteriormente afirmado pelo Ministro da saúde, há sempre a questão técnica envolvida: Acreditamos numa declaração já que nem Autoridade Nacional de Proteção de Dados temos constituída para validar tal assertiva?
Lembre-se que na atualidade, DADOS são o poder. Tê-los faz toda a diferença, seja na estratégia, seja no uso para um fim ou outro.
O próprio Ministro afirmou que abriu um cadastro voluntário e conseguiu mais de 3 mil pessoas em poucos dias. Por que então pegar todos os cadastros de telefones, endereços, dados cadastrais dos cidadãos? Por que não abrir um canal para quem quiser, AUTORIZE o uso dos seus dados?
O Estado não é o salvador da pátria. São nossas atitudes individuais que fazem o Estado, inclusive ao eleger nossos representantes.
Penso que o melhor no ambiente democrático é justamente isto: O indivíduo tem direito de escolha, como bem preceitua a Lei Geral de Proteção de Dados.
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