Já se passaram seis anos desde que o Pacto Global das Nações Unidas foi lançado (1º/1/2016). A Agenda 2030 tem 17 objetivos subdivididos em 169 metas. Em linhas gerais, o que se quer é garantir avanços nas três dimensões do desenvolvimento sustentável: econômica, ambiental e social. Além de acabar com a fome do planeta, a degradação do meio ambiente e viabilizar o progresso econômico, os chefes de estado que integram a ONU também se comprometeram com a redução das desigualdades e com iniciativas que promovam sociedades mais pacíficas, justas e inclusivas. É nesse ponto que vêm ganhando força – inclusive na indústria – algumas mudanças na cultura organizacional e, como desdobramento, a comunicação não violenta (CNV).
No início dos anos 60, durante o auge do movimento a favor dos diretos civis e contra a segregação racial nos Estados Unidos, o psicólogo norte-americano Marshall Rosenberg ficou conhecido por introduzir – e ensinar – técnicas de comunicação e mediação entre pessoas que poderiam ser aplicadas na esfera pessoal, organizacional e política. Hoje, naquele país, o psicólogo dá nome a um instituto que leva seu legado adiante.
Também chamada de comunicação empática, a CNV recomenda que os praticantes se concentrem em quatro componentes estratégicos: observação, sentimento, necessidades e solicitação. Em resumo, o psicólogo sugere questionar se a mensagem que está sendo recebida, seja por meio de fala ou de ações, tem algo a acrescentar de forma positiva. O segredo é fazer essa observação sem criar um juízo de valor. Depois, é preciso entender e nomear qual sentimento a situação desperta. A partir desse ponto, deve-se reconhecer quais necessidades estão ligadas ao sentimento observado. E, por fim, fazer uma solicitação específica, ligada a ações concretas, deixando claro o que se quer da outra pessoa.
Rosenberg ressalta que, quando alguém expressa suas necessidades, há uma possibilidade maior de que elas sejam atendidas e que a consciência desses três componentes vem de uma análise pessoal clara e honesta. Sendo assim, o especialista e todos os seus seguidores recomendam usar uma linguagem positiva, em forma de afirmação, para se fazer um pedido, evitando frases abstratas, vagas ou ambíguas.
A Katrium Indústrias Químicas (RJ) é uma das primeiras indústrias a aplicar esse tipo de treinamento como parte de um processo maior de transformação da cultura organizacional – que vem ocorrendo há alguns anos. De acordo com o diretor-presidente José Rosenberg, muitas mudanças já alcançaram resultados positivos a partir da criação de um manual de ética e de uma área de compliance. “Além da preocupação em atuar de forma sustentável, respeitando os colaboradores, o ambiente e os processos internos e externos, é fundamental estabelecer as bases para uma cultura de integridade forte e perene. O lema é liderar pelo exemplo”.
Segundo Andréa Garcia Neves, especialista em CNV que está trabalhando com as equipes da Katrium, um dos principais desafios é conscientizar os colaboradores de que se comunicar bem é um exercício diário. “A rotina de quem trabalha numa fábrica é intensa e há grande volume de informação. Nesse contexto, é comum não haver espaço para empatia, escuta ativa e atenção. Muitas vezes, a comunicação acontece de modo automático, sem clareza. E isso pode gerar conflitos, erros, retrabalho e custo extra”.
Outro grande desafio apontado pela especialista é o entendimento das necessidades e sentimentos. “Todos os sentimentos são despertados por necessidades atendidas ou não, mas a maioria das pessoas não reconhece suas necessidades nem consegue nomear os seus sentimentos. Sendo assim, é muito comum culpar, julgar, levar situações de trabalho para o lado pessoal. Só que, sem fazer solicitações claras, as reais necessidades quase nunca são atendidas e isso gera conflitos. Partindo do princípio que colocamos para fora o que temos dentro, a CNV é um convite ao autoconhecimento e pode ser aplicada também na vida pessoal, com toda a família”.
Na Katrium, os treinamentos são realizados nas fábricas de Honório Gurgel e Santa Cruz, em horário comercial. Quem entra para o trabalho à noite e sai pela manhã recebe hora extra para participar. As turmas contam com no máximo 25 colaboradores e os temas são abordados de acordo com as vivências da fábrica – mas também podem partir da necessidade de algum participante dividir suas dificuldades em resolver determinado conflito. Além de dinâmicas comportamentais, filmes são recursos muito utilizados para que as pessoas se manifestem livremente sobre determinadas situações e possam compartilhar aprendizados. Mais de 12 turmas já passaram pelo treinamento, que acontece semanalmente e tem duas horas e meia de duração.