São praticamente quatro anos desde a promulgação da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei 13.709/218), também conhecida como LGPD, e ainda muitas instituições não estão em conformidade quando o assunto é tratamento de dados de menores de idade. Mesmo com a regulamentação em vigor desde setembro de 2020, o maior desafio tem sido atender plenamente os requisitos do artigo 14 da Lei, que exige uma ação mais direcionada para o público juvenil. O resultado é que ainda estamos distantes de ter uma cultura de privacidade e segurança que garanta a proteção da criança e do adolescente, principalmente nos ambientes digitais.
É o que aponta a pesquisa inédita realizada pelo Instituto iStart durante os dias 13 a 30 de junho, coordenada pela Dra. Carolina Chiavaloni, junto com um grupo de outras 12 pesquisadoras especializadas em proteção de dados com foco em criança e adolescente. De acordo com os dados obtidos com o estudo, pouco mais de 10% das organizações analisadas oferecem informações necessárias aos pais e responsáveis, de maneira simples, clara e acessível, e adequada também ao entendimento da criança, o que é exigido pelo artigo 14, § 6º da LGPD. Ou seja, quase 90% não cumprem com a exigência.
Além disso, somente 53% das empresas oferecem barreiras técnicas ao acesso que envolve criança, que é o menor de 12 anos de idade, como solicitar permissão do responsável para fazer login na plataforma, outro requisito da Lei, no artigo 14, § 1º. e § 5º. Outro dado que chama atenção é em relação à necessidade de informar que é realizado o tratamento de dados de crianças e adolescentes. Apenas 36,7% dos locais analisados estão de acordo com a norma.
Na avaliação da advogada especialista em Direito Digital Patricia Peck, presidente do Instituto iStart, os pais sempre devem conferir as regras de utilização das plataformas e redes sociais, e verificar a idade mínima. Muitos serviços digitais exigem que o usuário tenha ao menos 13 anos, pois não são adequados para serem usados por crianças sozinhas, e precisam ser assistidos ou supervisionados – ainda mais com as novas regras trazidas pelo artigo 14 da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
“Ao criar perfis infantis e publicar detalhes de sua vida íntima, os pequenos ficam mais suscetíveis a pessoas mal-intencionadas. O dever de vigilância é dos pais ou responsáveis, conforme determina o artigo 932 do Código Civil. É preciso saber mais da vida digital dos filhos. E, acima de tudo, é importante educar a geração digital para ela saber se proteger.”
Segundo Chiavaloni, a coordenadora do projeto, a ideia de realizar o levantamento foi justamente alertar sobre a importância do tema de privacidade e proteção de dados de crianças e adolescentes, bem como as boas práticas no uso das ferramentas digitais. O objetivo central foi analisar a adequação de algumas das principais empresas do mercado, organizadas por setores econômicos e que são de uso frequente do público infantojuvenil. Como metodologia, a pesquisa utilizou uma amostragem de um mínimo de 3 empresas por setor, tendo como base de decisão a relevância, a representatividade e o alcance das empresas que ofertam serviços ou produtos pela internet e que são usados em grande volume por crianças e adolescentes.
A pesquisa foi feita por meio de questionário via Google Forms online, para avaliar se as empresas atendiam os quesitos específicos da lei no que se refere a crianças e adolescentes. Todas as questões da pesquisa foram validadas por uma segunda pesquisadora e questões mais amplas, validadas pelo grupo de pesquisadoras como um todo.
Em termos gerais, as plataformas de games para adolescentes, de streaming e de saúde são as que se apresentaram com conformidade mais baixa, quando comparadas aos demais setores.
Considerando o período de férias escolares, é muito importante os pais ficarem atentos, principalmente no ambiente de jogos online. É o que mostrou o resultado da análise.
É extremamente relevante que as empresas atualizem seus ambientes para ficarem em conformidade com a LGPD, para termos uma internet mais transparente, ética, segura e saudável para crianças e adolescente brincarem. Mais que ter a lei, é preciso educar sobre a lei para alcançarmos a mudança de comportamento necessária e termos uma real cultura de proteção de dados no Brasil. E esta jornada de aprendizagem deve iniciar com os jovens.
Participaram da pesquisa: Ana Carolina Paes de Mello, Ana Paula Canto de Lima, Carolina Chiavaloni Ferreira Buccini, Consuelo Milani Rodrigues, Denise de Araujo Berzin Reupke, Fabiana dos Santos Medeiros, Karem Luiza da Costa, Karina Kaehler Marchesin, Maria José Ciotto Luccas, Marisol Gonzalez Martinez, Pietra Quinelato, Rosalia Ometto, Thais Torinho Freitas Galina